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Registro de baleia carregando seu filhote morto é uma das finalistas de concurso de fotografia ambiental

“Life Cycle” ou “Ciclo da Vida” foi o título que Franco Banfi deu à sua obra fotográfica que participou da terceira edição do Prêmio de Fotografia Ambiental da Fundação Príncipe Albert II de Mônaco, ocorrida neste ano. O concurso, que tem o objetivo de utilizar a arte da fotografia para sensibilizar o mundo a respeito da preservação ambiental e apreciar todo o potencial de sua beleza, analisou, por meio de 9 jurados, cerca de 10 mil imagens enviadas por 2.300 fotógrafos de inúmeros países.

O MOMENTO DO CLICK

A fotografia, que ficou entre as melhores, foi capturada em 2019 no oceano Atlântico, mais especificamente na região da ilha de Tenerife, pertencente ao arquipélago das Canárias. O fotógrafo suiço, que é especializado em fotografia da vida selvagem, natureza e ambiente aquático, registrou a cena comovente de baleia-piloto-de-aleta-curta fêmea carregando seu filhote morto pela cauda, relutante em soltá-lo, num mergulho taciturno.

Segundo o fotógrafo, que também já visitou terras brasileiras e capturou imagens de sucuris nos rios do Mato Grosso, a mãe e o filhote estavam sendo acompanhados e apoiados por seu grupo. “Fiquei muito triste em testemunhar sua dor, mas me emocionei com a coesão desses animais que apoiaram e consolaram a mãe durante seu mergulho sem fim”, declarou ele à fundação criadora da premiação.

HABITAT E EXPECTATIVA DE VIDA DAS BALEIAS-PILOTO

As baleias-piloto são mamíferos marinhos da infraordem dos cetáceos que habitam as águas tropicais e temperadas de todos os oceanos — exceto do Mar Mediterrâneo -, podem ter de 5,5 (fêmea) a 7 (macho) metros de comprimento e chegar a pesar mais de 3 toneladas. Por possuírem poucos predadores naturais, elas vivem de 45 a 60 anos se alimentando principalmente de lulas.

COMPORTAMENTO

Esses animais são vistos sozinhos muito raramente por serem altamente sociáveis entre seu grupo, que é formado por todos os gêneros e idades. Essa característica, apesar de benéfica para a segurança dos membros, também os tornam mais vulneráveis a encalhes em massa.

Um exemplo foi o ocorrido em setembro de 2022, na região da Tasmânia — local que registra encalhes recorrentes de diversos tipos de baleias -, onde cerca de 230 baleias-piloto foram encontradas encalhadas e metade delas não conseguiu sobreviver. O Programa de Investigação de Encalhe de Cetáceos no Reino Unido chegou a registrar mais de 12 mil cetáceos encalhados desde 1990.

GESTAÇÃO E MATERNIDADE

Os cetáceos fêmea chegam tarde em seu período maduro de reprodução, o que ocasiona em poucas gestações e uma alta taxa de sobrevivência. Após a concepção do feto, as baleias-piloto levam cerca de 15 meses para dar à luz ao filhote, momento em que iniciam o processo de amamentação que pode durar anos, mesmo quando o baleato já consome alimento sólido.

Assim como ocorre com diversas outras espécies do reino animal, sejam elas aquáticas, terrestres ou aéreas, o instinto maternal desempenha um papel fundamental na sobrevivência da prole. Na biologia, toda a dedicação em adquirir recursos para o bem-estar dos filhotes, tal como arriscar a própria vida para garantir a dos seus descendentes, é chamada de investimento parental.

Mesmo quando as baleias-piloto não são mais capazes de se reproduzir, elas podem continuar produzindo o leite materno que é destinado a filhotes de outras baleias impossibilitadas de fazê-lo. Além disso, quando uma das fêmeas vai conceber seu filhote, as veteranas do grupo agem como parteiras e ficam em seu entorno ajudando na expulsão do feto do corpo. Quando ficam mais velhas, se tornam as matriarcas e pilares fundamentais de seu grupo, permanecendo com ele a vida toda.

LUTO

Na fotografia de Banfi, a característica de sociabilidade e união da espécie fica evidenciada também nos momentos de luto. Franco conta que o caso da baleia-piloto carregando seu filhote morto não foi o único que presenciou. “Depois de alguns dias, duas fêmeas carregando seus bebês natimortos foram vistas em mar aberto, vagando por muito tempo, relutantes em abandoná-los. O macho manteve a mim e aos outros mergulhadores a uma distância segura das duas fêmeas; ele nunca foi agressivo, mas sua vontade de proteger as duas mães era evidente. A dor de todo o grupo quebrou meu coração”.

AMEAÇAS À ESPÉCIE

Todas as espécies da natureza que possuem alguma serventia para o desenvolvimento ou sobrevivência do Homem têm a sua existência ameaçada, e no caso das baleias-piloto não é diferente. A interferência humana se dá por três principais meios: a caça como sobrevivência e comércio, pela cultura e tradição e pela poluição dos oceanos.

SOBREVIVÊNCIA E COMÉRCIO

No Japão, a pesca de baleias ficou por três décadas sendo considerada uma prática ilegal pois o país fazia parte da Comissão Baleeira Internacional (IWC), que foi criada para garantir a preservação dos cetáceos através da pesca sustentável, e do qual participava desde 1951.

O IWC só permite a caça às baleias para fins científicos, mas segundo denúncias de ONGs, o país só utilizou a ciência como pretexto para mascarar a caça comercial indiscriminada no país nas águas do território japonês.

Em um primeiro momento, a Noruega e a Islândia também aderiram ao acordo da IWC, mas ambas abandonaram os termos da Comissão alegando que não tinham mais a intenção de proibir a caça comercial. Elas retornaram ao acordo mas impuseram as suas próprias condições dentro de brechas do próprio memorando.

Os dois países ainda mantêm o direito da prática, embora a Islândia não realize caças comerciais de baleias desde 2018 e pretenda acabar totalmente com a atividade até o ano de 2024. Nos Estados Unidos, mais especificamente no Alasca, há autorização para a caça pois a justificativa diz respeito à subsistência dos povos nativos, que consomem tanto a carne quanto o óleo e gordura das baleias.

Os brasileiros também aderiram aos termos recomendados pela Comissão Baleeira Internacional em 1986 e tornaram proibida a caça de baleias em território nacional. A punição para os caçadores de cetáceos pode chegar até cinco anos de prisão e a perda da embarcação.

CULTURA

Nas Ilhas Faroé, arquipélago pertencente à Dinamarca, a caça às baleias é um hábito secular chamado “grindadráp”. Na Baía de Miðvágur, a temporada de caça às baleias-piloto se inicia em meados de maio para consumo dos locais, mesmo que já tenha sido constatado no ano de 2008, pelos médicos locais Pál Weihe e Høgni Debes Joensen e declarado à Sea Shepherd Conservation Society, que a carne contém mercúrio, PCBs e derivados do DDT que as tornam inseguras para consumo humano.

O banho de sangue das caças faroenses são justificadas pelos habitantes como uma prática tradicional, cultural e essencial para a subsistência da ilha, que está localizada numa região remota onde os recursos naturais são escassos. Além disso, se apoiam na autorização da lei e em registros da atividade datadas de 1584.

POLUIÇÕES QUÍMICAS, FÍSICAS E SONORAS

Além dos motivos comerciais, culturais e de subsistência que permitem a interferência do ser humano no território das baleias, outro fator é a destruição do habitat natural desses animais. Segundo a National Geographic Brasil, a principal causa da morte de cetáceos causada pelo Homem é quando eles ficam presos em redes de pesca.

Outro motivo é a poluição por químicos — principalmente óleo — e plásticos jogados nos oceanos — ou em lugares inadequados que desembocam neles — e representam um perigo de morte por asfixia ou contaminação. De acordo com uma pesquisa da revista científica Nature Sustainability, 80% dos materiais encontrados nos oceanos são plásticos, mas são infelizmente acompanhados por metais, vidro, roupas, borracha, papel e madeira processada.

Na escuridão da profundidade do oceano, seria uma tarefa difícil para as baleias encontrar seus colegas apenas pelo reconhecimento visual. Por isso, para se comunicarem e se localizarem, os cetáceos emitem vocalizações que permitem a localização de seu grupo — e também sua própria localização — pelo eco do som no ambiente.

Portanto, mais um aspecto que atinge negativamente a vida das baleias-piloto e pode levá-las à morte é a poluição sonora subaquática causada por sonares e pesquisas sísmicas, podendo causar surdez, desorientação ou medo nos animais e fazê-los ficarem impossibilitados de mergulhar e caçar sua comida. Isso desencadeia em desnutrição e, por consequência, no arraste até o litoral.

AS SEMELHANÇAS SÃO MAIORES DO QUE PARECEM

Apesar das diferenças e possibilidades hierárquicas, as baleias-piloto — não somente elas, mas todos os animais — e os seres humanos compartilham, no final das contas, os mesmos rituais ao longo da vida. Existe uma rede de apoio no momento do nascimento, o zelo pela segurança das crias, assim como o sofrimento no momento da morte e um luto incomparável e muitas vezes relutante com a partida de um filho.

Na foto de Franco Banfi, os olhos melancólicos da baleia-piloto fêmea exemplificam mais do que nunca a similaridade dos sentimentos, cultura social e a capacidade mental de apoiar quem se ama nos momentos mais difíceis, independente da espécie.

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